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Desregulação Emocional no TDAH

Postado por Ágatha Stoll Andrade em 08/10/2025 22:41


O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é muito mais do que desatenção, impulsividade e hiperatividade.
Muitas pessoas que vivem com o transtorno relatam algo que costuma ser deixado de lado nas conversas: a intensidade emocional.

Explosões de raiva, frustração por pequenas coisas, dificuldade em se acalmar depois de um conflito, ou até uma sensação de “montanha-russa emocional” fazem parte da desregulação emocional, um componente que vem ganhando destaque nos estudos sobre o TDAH.

 

O que é desregulação emocional?

As emoções são inerentes à vida e são mecanismos naturais que nos ajudam a reagir ao ambiente.
Mas quando o cérebro tem dificuldade em modular essas emoções, elas dominam o comportamento (e aí que surge a desregulação emocional).

A desregulação emocional é um dos componentes do TDAH, além da desatenção, impulsividade e hiperatividade. Pesquisas indicam que entre 25% e 45% das pessoas com o transtorno apresentam desregulação emocional (ANTONY et al., 2022). São indivíduos que tendem a reagir com mais intensidade, a se irritar facilmente e a demorar mais tempo para se acalmar. Isso impacta o humor, os relacionamentos e até o desempenho profissional.

Além disso, a desregulação emocional está frequentemente associada a ansiedade, depressão e problemas de sono (VIERING, 2021; MARTZ et al., 2023), o que reforça a importância de olhar para o aspecto emocional do TDAH — e não apenas para os sintomas de desatenção e impulsividade.

 

O que acontece no cérebro?

O TDAH envolve alterações em regiões cerebrais relacionadas ao controle emocional, como o córtex pré-frontal e a amígdala (VIERING, 2021).
Essas áreas ajudam a tomar decisões e controlar impulsos, mas quando há desequilíbrio entre elas, as emoções podem fugir do controle.

Outro fator importante é a dopamina, neurotransmissor envolvido na motivação e no sistema de recompensas.
Em pessoas com TDAH, a dopamina costuma ter um funcionamento diferente, o que faz com que o cérebro busque recompensas imediatas em vez de resultados de longo prazo.

A chamada hipótese do déficit na transferência dopaminérgica (DTD) (TRIPP & WICKENS, 2023) explica que, no TDAH, o cérebro tem dificuldade em associar ações presentes a recompensas futuras — e isso interfere na autorregulação, na motivação e no controle das emoções.

 

Estratégias de regulação emocional

É possível desenvolver habilidades de regulação emocional — e a psicologia tem ferramentas eficazes para isso.
Entre as principais abordagens estudadas estão:

1. Mindfulness e meditação

As práticas de atenção plena ajudam a reconhecer emoções sem reagir automaticamente a elas.
Estudos mostram que o mindfulness pode aumentar a atividade do córtex pré-frontal (ligado ao autocontrole) e reduzir a reatividade da amígdala (HÖLZEL et al., 2011; TAREN et al., 2015).
Com o tempo, a prática melhora o foco, o humor e a capacidade de lidar com situações emocionalmente intensas.

2. Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)

A TCC é uma das terapias mais bem documentadas para adultos com TDAH (HALMØY et al., 2022).
Ela ajuda o paciente a identificar padrões automáticos de pensamento e comportamento, favorecendo o controle de impulsos e a gestão emocional.

3. Terapia Comportamental Dialética (DBT)

Originalmente criada para o tratamento do transtorno de personalidade borderline, a DBT tem mostrado resultados positivos em pessoas com TDAH (HALMØY et al., 2022).
Essa terapia combina aceitação e mudança, ensinando habilidades práticas de regulação emocional, tolerância ao estresse e atenção plena.
Os efeitos tendem a se manter por meses após o fim do tratamento.

4. Terapia Cognitiva Baseada em Mindfulness (MBCT)

A MBCT une técnicas da TCC ao mindfulness.
Um estudo com universitários com TDAH (GU et al., 2018) mostrou reduções significativas em desatenção, impulsividade e sintomas de ansiedade e depressão após seis semanas de prática.
Os ganhos se mantiveram mesmo meses depois do fim da intervenção.

 

O papel do tratamento combinado

Os melhores resultados surgem quando se combinam medicação, psicoeducação e psicoterapia (VIERING, 2021; MARTZ et al., 2023).
Enquanto a medicação ajuda a equilibrar a neuroquímica cerebral, a terapia trabalha o autoconhecimento e o desenvolvimento de habilidades emocionais.

Mais do que “controlar os sintomas”, o objetivo é permitir que a pessoa viva com mais equilíbrio, entendendo seus próprios gatilhos e aprendendo a transformar sua intensidade emocional em um ponto de força.

 

Conclusão

A desregulação emocional é uma parte central — e muitas vezes invisível — do TDAH.
Reconhecer isso ajuda a abandonar a ideia de “falta de força de vontade” e a enxergar o transtorno como uma diferença no funcionamento cerebral que pode ser manejada com estratégias adequadas.

Com acompanhamento psicológico, psicoeducação e práticas de regulação emocional, é possível aprender a lidar melhor com o que se sente e viver de forma mais equilibrada, consciente e leve.

 

REFERÊNCIAS

ANTONY, E. M.-A.; PIHLAJAMÄKI, M.; SPEYER, L. G.; MURRAY, A. L. Does emotion dysregulation mediate the association between ADHD symptoms and internalizing problems? A longitudinal within-person analysis in a large population-representative study. Journal of Child Psychology and Psychiatry, [S.l.], v. 63, n. 12, p. 1583–1590, 2022. DOI: https://doi.org/10.1111/jcpp.13624

HALMØY, Anne et al. Dialectical behavioral therapy-based group treatment versus treatment as usual for adults with attention-deficit hyperactivity disorder: a multicenter randomized controlled trial. BMC Psychiatry, [S.l.], v. 22, p. 738, 2022. DOI: https://doi.org/10.1186/s12888-022-04356-6. Disponível em: https://bmcpsychiatry.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12888-022-04356-6.

MARTZ, Emilie; WEINER, Luisa; WEIBEL, Sébastien. Identifying different patterns of emotion dysregulation in adult ADHD. Borderline Personality Disorder and Emotion Dysregulation, v. 10, n. 1, p. 28, 2023. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s40479-023-00235-y. 

TAREN, A. A.; CRESWELL, J. D.; GIANAROS, P. J. Mindfulness meditation training alters stress-related amygdala resting state functional connectivity: a randomized controlled trial. Social Cognitive and Affective Neuroscience, v. 10, n. 12, p. 1758–1768, 2015. https://doi.org/10.1093/scan/nsv066.

TRIPP, G.; WICKENS, J. R. Using rodent data to elucidate dopaminergic mechanisms of ADHD: Implications for human personality. Development and Psychopathology, Cambridge University Press, v. 20, n. 4, p. 1169–1188, 2023. DOI: https://doi.org/10.1017/S0954579408000553.

VIERING, T. et al. Emotion dysregulation and integration of emotion-related brain networks affect intraindividual change in ADHD severity throughout late adolescence. NeuroImage, [S.l.], v. 245, p. 118729, 2021. DOI: https://doi.org/10.1016/j.neuroimage.2021.118729
 






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