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Análise simbólica do Conto 'A Bela e a Fera' - Uma Jornada Feminina

Postado por Daniela Dantas Furlaneto em 11/07/2025 15:20


 
“Os contos de fadas são a expressão mais pura e simples dos processos psíquicos do inconsciente coletivo.”
 
(Marie Louise von Franz)
 

 

No conto A Bela e a Fera podemos entrar em contato com a Jornada de Desenvolvimento do ego Feminino.

O conto original A Bela e a Fera é uma história de domínio público, com raízes no folclore francês do século XVIII. A versão mais conhecida foi escrita por Jeanne-Marie Leprince de Beaumont em 1756, e desde então tem sido adaptada inúmeras vezes ao longo dos séculos.

Aqui vai um breve resumo do conto clássico A Bela e a Fera, na versão de Jeanne-Marie Leprince de Beaumont:

Antes de partir em viagem, o pai de Bela, um comerciante que havia perdido sua fortuna, pergunta às filhas o que desejam que ele traga de volta. As irmãs mais velhas, vaidosas e egoístas, pedem joias, vestidos caros e adornos luxuosos, acreditando que a riqueza da família será restaurada. Já Bela, humilde e gentil, não pede nada — apenas deseja que o pai volte em segurança. Insistindo para que ela escolha algo, Bela finalmente pede uma simples rosa, pois não havia visto nenhuma desde que se mudaram para o campo.

Esse pedido singelo se torna o ponto de virada da história: ao colher a rosa em um jardim encantado, o pai desperta a ira da Fera, que exige que uma de suas filhas vá viver no castelo como pagamento. Bela, corajosa, se oferece para proteger o pai — e assim começa sua jornada mágica.

Dessa forma, essa jovem chamada Bela, filha de um comerciante empobrecido, se oferece para viver em um castelo encantado como forma de salvar seu pai, que havia colhido uma rosa do jardim da misteriosa Fera. Apesar do medo inicial, Bela descobre que a Fera é gentil e generosa. Com o tempo, ela desenvolve carinho por ele e percebe que sua aparência monstruosa esconde um coração nobre.

Quando Bela retorna à sua família por um breve período, ela se atrasa e encontra a Fera à beira da morte por tristeza. Ao confessar seu amor, a maldição que o transformava em fera é quebrada — revelando um príncipe humano. Eles se casam e vivem felizes, enquanto as irmãs invejosas de Bela são punidas por sua crueldade.

A Bela representa o ego feminino ainda na sua forma infantil e identificado com o pai. Ela está sempre fazendo algo, como os serviços da casa, sendo uma boa menina, obediente. Ela faz de tudo para ver esse pai satisfeito, ou seja vive em função de atender suas necessidades e expectativas. Como ela não deseja nada para si, ainda não se vê como um indivíduo desejante e autônomo em contraste das irmãs que não se envergonham de pedir presentes caros para si mesmas enquanto Bela pede apenas uma rosa colhida pelo caminho.

Na sua jornada de individuação (processo de se tornar quem se é) esse ego vai precisar se separar desse pai, psicologicamnete falando, para se fortalecer e se flexibilizar antes de ir para o mundo. Então ela será chamada para resolver essas questões interiormente.

O Self, conceito que Jung cunhou para se referir à Totalidade do Si-Mesmo que impulsiona o ego, gerou uma tragédia colocando esse pai em perigo para que ela diante desse conflito seja forçada a fazer uma escolha.

De qualquer forma essa separação ocorreria, mas o chamado do Self é fazer com que o ego faça sua diferenciação de forma consciente, que o próprio ego tome suas decisões. Diante do embate Bela precisa fazer uma escolha.

Ela então escolhe ficar com a Fera para salvar seu pai. A Fera entra na história simbolizando todo conteúdo contrário ao consciente de Bela, a Fera é seu oposto, é tudo o que ela não é. A essa figura também podemos chamar de Sombra. Nesse caso é a sombra feminina. E ela aceita a jornada de descida ao inconsciente. No sentido simbólico ficar com a Fera é abandonar os padrões de boa menina, entrar em contato com seus aspectos sombrios, tudo aquilo que um dia, diante de seu pai, parecia feio, asqueroso, repugnante e seu ego rejeitou para ser aceito e amado.

Diante da Fera, ou seja, diante dos seus aspectos sombrios, ela descobre que muitas coisas relegadas ao inconsciente não são tão ruins assim. A partir daí o Ego começa a se flexibilizar. 

Isso fica muito bem representado pelo anel, um círculo que simboliza a totalidade do Self. Através do anel como ponte entre inconsciente e consciente, ela consegue entrar em contato com esse pai, mas que não vai abandonar a Fera, prometendo que voltará. Aqui ela demonstra que não teme mais seus aspectos sombrios, já não se sente tão ameaçada diante dos conteúdos do inconsciente como antes. Está começando a amadurecer.

Quando ela volta para a Fera ela teme ter demorado demais fazendo com que a Fera tenha morrido e encontra a Fera deitada no chão, quase morrendo. Ou seja, ao se voltar para o pai ela deu as costas novamente para os aspectos de sua alma.

A Bela então diz que se casa com a Fera para não a perder pois já a aceita como ela é. Nesse momento a Fera vira um príncipe. Isso significa que o conteúdo inconsciente acabou de ser transformado, não existe mais como um aspecto animalesco, primitivo. Ele se humanizou, foi integrado à consciência. Então quando Bela, representante desse ego feminino, faz a escolha e diz que se une à Fera, a união dos opostos acontece.

No final desse conto o ego, ao integrar sua sombra, simbolizado pelo casamento consegue se desmembrar da imago paterna. A jovem não vive mais em função do pai e pode ir em busca da própria vida e se lançar no mundo. Agora com uma personalidade mais inteira e flexível está também mais capaz de enfrentar os desafios da vida e ser quem se é de forma mais autêntica.

 "Um dia você será velho o suficiente para começar a ler contos de fadas novamente"  (C.S.LEWIS)

 

Referências

JUNG, C. G. A psicologia do inconsciente. 24. ed. Petrópolis: Vozes, 2014.

JUNG, C. G. O homem e seus símbolos. 19. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

JUNG, C. G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. 4. ed. Petrópolois: Vozes, 2000.

 

DANIELA DANTAS FURLANETO
Psicóloga junguiana - CRP15 7957
Contato: (82) 99832-0949





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