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AS NUANCES DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NA SAÚDE PSICOLÓGICA DAS MULHERES

Postado por Laryssa da Silva Nunes em 18/02/2025 16:37


AS NUANCES DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NA SAÚDE PSICOLÓGICA DAS
MULHERES

 

4.1 TIPOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E SUAS CONSEQUÊNCIAS
PSICOLÓGICAS
De acordo com o Documento de Referência para a Atuação de Psicólogos em Serviços de Atenção à Mulher em Situação de Violência do Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2013), a violência pode ser do tipo sexual, psicológica, patrimonial, moral e física. A violência sexual consiste na prática sexual sem o consentimento do outro, com uso de força, intimidação, chantagem, ameaças ou outras formas que anulem a vontade pessoal do indivíduo. Na percepção de Santos (2012) forçar relações sexuais quando a mulher não quer, ou quando estiver dormindo, ou sem condições de consentimento, ou até mesmo forçando-a a olhar imagens pornográficas; obrigar a mulher a fazer sexo com outra(s) pessoa(s); impedir a mulher de prevenir a gravidez, forçá-la a engravidar ou ainda forçar o aborto quando ela não quiser também se constituem formas de violência doméstica sexual contra a mulher.


De acordo com Santos (2012), as principais consequências psicológicas da
violência sexual contra a mulher, são: a) Dificuldades de adaptar-se sexualmente e/ou
afetivamente com outras pessoas; b) Medo de estabelecer relações de confiança; c)
Ideias de morte e suicídio; d) Depressão, agressividade, baixa autoestima; e)
Pesadelos, comportamentos autodestrutivos; f) Transtornos mentais, alto nível de
stress, g) Ansiedade.


Indo além de condutas que constranjam, mediante força ou ameaça a mulher a participar de relação sexual não desejada, incluindo também a limitação ou anulação do exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos, como forçar o aborto ou o uso de método contraceptivo (Guimarães; 2015). Já a violência psicológica ocorre com tentativas de controle das ações e valores do outro, por intimidação, manipulação, ameaças a vítima ou seus familiares. Ainda, atos de humilhações, forçar o isolamento social e familiar, exploração, rejeição e agressão verbal também são formas de violência psicológica (CFP, 2013).
De acordo com Brasil (2006), a violência psicológica pode ser definida por qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e
à autodeterminação (Brasil, 2006, n.p.). Os sintomas psicológicos comumente observados em mulheres vítimas de agressão são: a) Insônia e pesadelos; b) Irritabilidade; c) Dificuldade concentração; d) Distúrbio alimentares; e) Além de diferentes transtornos como depressão, ansiedade, síndrome do pânico, Transtorno do Estresse pós-traumático e; f) Presença de comportamentos autodestrutivos (Silva, 2006). A violência patrimonial, por sua vez, ocorre quando o indivíduo subtrai, retêm objetos e pertences, causando danos e perdas materiais, de documentos pessoais e bens e valores do outro (CFP, 2013). Já a violência moral ocorre quando há calúnia, difamação ou injúria contra a reputação. Dessa forma, observa-se que a violência doméstica moral contra a mulher atinge um dos bens mais valioso do ser humano que é a sua integridade de caráter, fazendo-a perpassar como uma pessoa de má índole, não merecedora de respeito, dignidade e confiança, aspectos importantes no convívio social contemporâneo.
Sendo assim, as principais consequências da violência doméstica moral contra a mulher são: a) Sentimento de inferioridade; b) Degradação da imagem da mulher; c) Perturbações psicossomáticas; d) Incapacidade e insegurança de realizar determinadas tarefas com medo da reação das outras pessoas; e) Falta de respeito das pessoas que fazem parte do seu ambiente familiar e; f) Exclusão do convívio social (Romero, 2015).

Vale lembrar que algumas dessas consequências não são manifestadas de modo imediato, portanto deve-se avaliar cuidadosamente esses sintomas, para assim prevenir e evitar que possíveis transtornos possam se agravar futuramente e dificultar o seu tratamento. Por fim, a violência física coloca em risco a integridade física da vítima, podendo causar lesões corporais, permanentes ou não, por meio de tapas, empurrões, e outros tipos de maus tratos (CFP, 2013). Na visão de Moura (2013) a violência física é a principal forma de violência doméstica contra a mulher. Esse tipo de violência ocorre através de agressões que provocam danos ao corpo da mulher. Isto fica evidente quando a autora declara que a violência doméstica física acontece quando uma pessoa (normalmente o companheiro), que está com poder em relação à outra (mulher), causa ou tenta causar dano não acidental, por meio de força física ou de algum tipo de arma que pode provocar lesões externa, interna ou ambas (Moura, 2013, p. 42). Todas essas formas de agressões físicas possuem consequências psicológicas para a vítima. Assim sendo, Porto (2014) lista as principais, são elas: a) Insônia, Pesadelos, Falta de concentração, Irritabilidade; b) Desenvolvimento da síndrome do pânico; c) Mudança de comportamento com a presença do agente agressor; d) Desenvolvimento do stress pós-traumático; e) Vergonha do corpo (principalmente quando apresenta hematomas) e; f) Comportamentos antissociais. Como esse fenômeno vem aumentando gradativamente ao longo dos anos e também os estudos em relação a violência contra a mulher ser também uma questão de saúde pública, que causam danos à saúde física e psicóloga, torna-se relevante compreender os tipos de violência que mais ocorrem, sendo a física, psicológica e estupro, sendo estes constituídos, como: ataque físico, uso da força física e ameaça (Coelho; Silva; Linder, 2014).


4.2 CICLO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
A ambivalência faz parte do longo processo de ruptura da usuária com o seu companheiro, “ruptura com a situação de violência conjugal se configura como um processo difícil, doloroso e, muitas vezes, lento, ao envolver a ruptura com o cônjuge violento. O que pode significar, dependendo das circunstâncias, a ruptura com sua vida cotidiana” (Rocha, 2007, p. 71 apud Dutra, 2013). Isso explica o medo por parte da grande maioria das mulheres, quando tem que denunciar o seu agressor, são decisões que podem implicar diretamente na sua vida pessoal, afetando diretamente sua família e os seus filhos, seja ela por conta de ameaças sofridas ou insegurança para com o sistema de justiça do nosso país.
Segundo Dutra, Prates, Nakamura e Villela (2013), estudos sobre as rotas percorridas pelas mulheres em busca de recursos para sair do circuito da violência identificam a falta de apoio, a revitimização e a atitude preconceituosa por parte dos profissionais que deveriam acolhê-las como problemas recorrentes.
Esses estudos sugerem que, mesmo com a existência de serviços especializados, sua atuação isolada não evita a exposição da mulher a novas violências. Consequentemente, percebe-se a importância da articulação em rede das instituições de proteção das mulheres em situação de violência para que ocorra uma mudança no ciclo da violência. Esse tipo de violência, afirma Schraiber et al. (2007), é construída pelo meio social e cultural. Consequentemente, durante um longo período, não foi reconhecida como um crime passível de punição. Com o movimento feminista, o processo de vitimização da mulher passou a ter visibilidade social e começou a se criticar a postura popular de que "em briga de marido e mulher, não se mete a colher".
De acordo com Frank (2007), a violência doméstica infringida por parceiros íntimos não se manifesta de maneira isolada e pontual. A partir do momento em que os abusos de ordem física, psicológica, sexual, moral e patrimonial se desenvolvem, tendem a ocorrer com uma determinada frequência, tornando-se alvo de repetições cíclicas. Assim, é possível dizer que a vítima fica imersa num ciclo de violência doméstica, no qual as condutas do agressor passam por fases com graus variados de tensão que encontram o seu ápice nos eventos de agressão física. A autora Walker (2009) explica que se inicia a primeira fase, a da intensificação da tensão, em que o homem passa a utilizar xingamentos, expressar sua insatisfação e sua hostilidade, mas sem alcançar um extremo. Nesse estágio, a mulher tentar acalmar o agressor e apaziguar a situação. Muitas vezes ela até consegue, o que leva a uma percepção equivocada de que ela pode controlar o parceiro. Também ocorre nessa fase de ser de fácil percepção a mudança de voz, de olhares, e tratamento da mulher como inferior.
Acontece com mais vigor as agressões verbais, que levantam a bandeira vermelha para um relacionamento possivelmente violento. Além de poder acontecer com mais frequência a violência moral e psicológica com a vítima temendo o perigo iminente por não conseguir controlar a raiva do parceiro, que se torna cada vez mais agressivo. Até que a tensão se torne um incidente de agressão/espancamento.
Sendo a fase em que ocorre o espancamento é tida como a mais crítica. Nessa, o agressor empreende toda a sua raiva. Ele usa a violência física como uma forma de corrigir e punir a parceira pelos comportamentos que ele julga serem incorretos, com o objetivo de coagi-la a fazer tudo que ele entende como devido e indispensável para a relação. É aqui que ele vai utilizar-se de toda a sua força física para impor sua autoridade, para mostrar a vítima "quem manda" e para obrigá-la a satisfazer todos os seus desejos e caprichos, pautados na lógica de subserviência da mulher frente ao parceiro (Walker, 2009).
Complementando ainda que depois de descarregar na vítima todas suas insatisfações e exigências, mediante uso da força brutal, o nível de tensão existente começa a diminuir e o agressor passa então a entabular um suposto arrependimento, buscando explicações e justificativas para o seu comportamento explosivo para assim obter o perdão da sua parceira, entrando na fase da “lua de mel”, na qual o parceiro não consegue cumprir suas promessas dando azo a novos comportamentos agressivos. Sendo nesse momento que muitas mulheres acabam perdoando o agressor e permanecem nesse relacionamento, acreditando na sua mudança (Walker, 2009).
O medo, as agressões físicas e morais, as represálias do agressos influenciaram a mulher a não se perceber no mundo como ser integral, bloqueando, muitas vezes, a tomada de decisão de romper com esse cotidiano castrador, com a manipulação do agressor, submetendo-se a um ciclo de violência, o que levou ao desconhecimento de seus direitos e à falta de informação. Porém, muitas vezes, essas
mulheres receberam o amparo da família e/ou amigos, e essa assistência configurou-se, em sua maioria, na decisão de denunciar o agressor e procurar apoio, apesar de que as marcas prevalecem e configuram um corpo sofrido num cotidiano de renúncias e incertezas (Oliveira, 2015).


4.3 ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO NO BRASIL REFERENTE A VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA
As medidas protetivas de urgência estão descritas no Capítulo II da Lei Maria da Penha. Elas são divididas em dois grupos, as que obrigam o agressor no artigo 22 e as direcionadas à ofendida previstas nos artigos 23 e 24 da lei, sendo de acordo as medidas de proteção junto com seus aspectos procedimentais compõem o chamado processo protetivo para a mulher que foi inaugurado pela Lei Maria da Penha.
As medidas de proteção que obrigam o agressor são focadas na limitação das suas condutas e comportamentos. Elas impõem, por exemplo, proibições com o objetivo de frustrar os meios que ele obtém para praticar os atos violentos como a proximidade que ele tem com a vítima com a qual se relaciona. Por isso, dentre as proibições encontram-se a de frequentar determinados locais, a de se aproximar e mantercontato com a vítima, os familiares dela e com as testemunhas. A equipe de atendimento multidisciplinar está prevista no Título V da Lei Maria da Penha. Nos termos do art. 29, os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra à Mulher podem contar com uma equipe de atendimento formada por profissionais das áreas jurídica, psicossocial e de saúde.
No Brasil, assim como em diversos países em desenvolvimento, verificou-se a importância de discutir políticas públicas para proteção da saúde da mulher, visto que somente a aplicação da pena não iria resolver a reiteração da violência. Sendo um dos mais importantes dispositivos de atenção integral, universal e de fácil acesso às mulheres é a (APS), que se constitui como porta de entrada para a rede de saúde, aliada à promoção do cuidado às mulheres.
De acordo com o Ministério da Saúde, demandas em saúde mental se constituem como a segunda causa de busca por atendimento na atenção básica, tornando-se referência no manejo e cuidado destes casos (Brasil, 2017b). A Atenção Primária à Saúde (APS) é responsável por atentar-se para as situações de risco, nas quais as equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF) devem intervir, oferecendo acolhimento e escuta qualificada; assim, tais ferramentas representam um primeiro passo na recuperação da vítima (Brasil, 2008).
Na política assistencial, os Centros de Referência Especializados em Assistência Social (CREAS) também constituem referência no apoio às famílias vítimas de violência. Configuram-se como órgãos públicos municipais, que ofertam o trabalho social especializado no Sistema Único de Assistência Social. Segundo o Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), o papel do CREAS compreende promover ações especializadas de caráter contínuo para as famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social, por violação de direitos. Neste sentido, inclui-se o atendimento à mulher em situação de violência doméstica e intrafamiliar, vítima de violência física, psicológica ou sexual. Contando com equipe multiprofissional, as intervenções são desenvolvidas através da oferta de atendimentos continuados, que visam integrar a mulher em espaços que promovam a reflexão e o empoderamento nas tomadas de decisões, possibilitando a superação da violência a qual foram expostas (MDS, 2011).
Monteiro (2012) aponta que os profissionais de saúde mental podem atuar de diferentes formas e em diferentes contextos, com um foco clínico ou psicossocial, em grupo ou individual. Na psicoterapia individual ou em grupo o objetivo com as mulheres vítimas de violência é fazer com que elas resgatem sua condição de sujeito, redescobrindo seus desejos e vontades, que durante a relação violenta foram anuladas, além de resgatar sua autoestima [...]. O psicólogo deve também orientá-la sobre seus direitos garantidos pela lei Maria da Penha (Monteiro, 2012, p. 46-47 apud Alves). Respectivo a isso, o CFP (2013, p.77) também fala que: “Todas as possibilidades de atuação devem se orientar pelo fortalecimento do protagonismo das mulheres e pelo entendimento multidimensional da violência, como produto das relações desiguais legitimadas e produzidas nas diferentes sociedades”.
De semelhante forma, Silva et al. (2015) afirmam que a violência contra a mulher é caracterizada não só por danos físicos, mas por uso da ideia de reprimir vida social da vítima, abalo psicológico, e submissão, com a ideia de o homem ser dominante e a mulher inferior. Em sua pesquisa, os principais agravos citados foram cefaleia, náuseas, sentimento de insegurança, stress, depressão, dificuldade com novos relacionamentos, revelando que os danos físicos interferem na qualidade de vida e as abala psicologicamente.
A partir de relatos como esse, percebe-se o sofrimento psíquico que as mulheres vítimas de violência por parceiro íntimo sofrem, gerando perda da autoestima, depressão e outras perdas significativas na saúde mental e física (Fonseca, 2012). Alguns dos estudos definiram que um número exorbitante de mulheres que sofrem esse tipo de violência já tiveram ou expressaram todos os trantornos como depressão, ansiedade, que corroboraram para danos irreparáveis de sua saúde emocional, levando até mesmo ao suicídio.
Não podemos descartar também os possíveis transtornos que após essa violência as mulheres podem desencadear e terem que passar por tratamentos para superação de um possível trauma que ao longo do tempo foi um fator que interferiu na vida pessoal, social e profissional dessa mulher, Mozambani et al. (2010) ainda avaliaram 17 mulheres que prestaram queixa de violência doméstica as quais 53% eram vítimas de agressão excessiva pelo companheiro. Como consequência dessa agressão, foi detectado, dentre o total, mulheres que tiveram grande probabilidade de apresentar transtorno depressivo maior, transtorno de estresse pós-traumático e elevados níveis de experiências dissociativas peritraumáticas. Um dos transtornos psicológicos que as mulheres vítimas de violência sofrem é o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), o qual foi caracterizado por Felippe et al. (2016).
A pesquisa realizada pelo Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP), em 2008, sobre as Práticas do profissional em Programas de Atenção às Mulheres em Situação de Violência, apontou que, de modo geral, as ações da Psicologia estão voltadas para: o acolhimento de vítimas; a avaliação de casos; elaboração de laudos e pareceres; realização de atendimentos individuais e grupais; e encaminhamento para os serviços complementares pertencentes à rede. Na psicoterapia, são realizadas intervenções com a intenção de promover a tomada de consciência sobre a realidade vivenciada, reflexões que possibilitam ressignificar o papel social da mulher, através do resgate da autoestima, incentivando a autonomia e empoderamento. Constatou-se, também, que alguns profissionais da psicologia realizam o atendimento aos agressores e demais participantes do núcleo familiar, o que é uma importante intervenção no combate à
replicação do fenômeno (CFP, 2012).

 






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