Postado por Thaís Evelyn Cruz Gonçalves em 30/01/2024 20:17
O perfeccionismo, em sua essência, consiste na busca incessante por atingir padrões elevados, porém, nem sempre essa busca é saudável. Enquanto a dedicação para alcançar metas e aprimorar o desempenho são aspectos positivos, a autocrítica constante e a incapacidade de aceitar erros podem resultar em uma carga significativa de estresse e sofrimento.
Ao abordar o perfeccionismo, é crucial destacar suas dimensões disfuncionais, que se manifestam em três categorias distintas:
Perfeccionismo Auto-Orientado:
Perfeccionismo Orientado para os Outros:
Perfeccionismo Socialmente Prescrito:
O perfeccionismo tem raízes em diversas áreas, como genética, aprendizado e influências parentais. A forma como somos criados pelos nossos pais desempenha um papel crucial. Pais muito rígidos podem levar a uma busca constante por evitar erros, enquanto pais perfeccionistas podem influenciar a adoção automática de padrões elevados. Experiências de abuso emocional na infância também podem contribuir. Além disso, a cultura ao nosso redor desde cedo nos faz associar nosso valor ao sucesso, criando uma mentalidade competitiva.
O perfeccionismo está frequentemente relacionado a problemas psicológicos, como ansiedade, distúrbios de humor, fadiga crônica e distúrbios alimentares. Além de contribuir para a manutenção desses problemas, o perfeccionismo desempenha um papel significativo no desenvolvimento desses quadros.
Pessoas perfeccionistas podem enfrentar problemas adicionais, como raiva excessiva, estresse e dificuldades nos relacionamentos, decorrentes das altas expectativas em relação aos outros. A presença constante de estresse e sentimentos de raiva pode afetar o sistema imunológico, aumentar a pressão arterial, causar dificuldades de sono e outros problemas de saúde.
Como os meus pensamentos influenciam o perfeccionismo?
Na Terapia Cognitivo-Comportamental, aprendemos que não são as situações em si que afetam nosso estado de humor, mas as interpretações que fazemos delas. A maneira como interpretamos as situações molda nossas respostas emocionais, comportamentais e fisiológicas.
Imagine uma situação em que você se sentia apreensivo, como ao realizar um trabalho. O que estava passando pela sua mente naquele momento? Será que todos os outros também vivenciavam o mesmo sentimento, ou cada um lidava com a situação de maneira diferente?
A interpretação que fazemos de situações específicas influencia nossas reações, não o evento em si. Nossas interpretações têm impacto direto em nossas emoções, comportamentos e respostas corporais. Pessoas com pensamentos perfeccionistas, como "eu devo ser perfeito," tendem a agir de acordo com essa interpretação sobre si mesmas. Esse comportamento pode confirmar o pensamento (verificar repetidamente se o trabalho está perfeito) ou evitar confrontá-lo (adiar uma tarefa). A evitação é comum no perfeccionismo, pois os padrões elevados geram ansiedade e estresse, levando o indivíduo a se envolver em atividades que aliviem esse estado emocional.
Além disso, fazemos avaliações sobre diversas situações, nós mesmos, nosso futuro e os outros, que podem ser distorcidas. Infelizmente, muitas vezes não questionamos essas avaliações, tratando-as como verdades inquestionáveis. Essas avaliações equivocadas são conhecidas como "pensamentos distorcidos" (Beck, 2013).
Para auxiliar na superação desses pensamentos distorcidos e promover uma maior flexibilidade cognitiva, é essencial identificar e questionar essas distorções cognitivas. Esse processo pode ocorrer por meio de registros, que podem ser feitos por escrito ou durante as sessões de terapia.
Como o meu problema pode estar sendo mantido?
O cerne do perfeccionismo não reside apenas nos padrões e metas estabelecidos, mas sim na inflexibilidade da autoavaliação e avaliação dos outros com base no alcance desses padrões. A dependência entre a forma como a pessoa se avalia e o cumprimento dos padrões estabelecidos é crucial para a persistência desse problema. Em suma, a rigidez na avaliação pessoal, atrelada aos padrões predefinidos, é o fator central na perpetuação desse desafio.
Os padrões rigorosos e exageradamente elevados, como "Preciso sempre obter ótimas notas nos estudos," são elementos centrais no contexto do perfeccionismo. Esses padrões inflexíveis frequentemente se manifestam junto a pensamentos distorcidos, como exemplificado por "Se eu não obtiver a nota desejada, isso quer dizer que sou incompetente," resultando em comportamentos coerentes, como dedicar longas horas aos estudos diários.
Diante desses padrões inflexíveis, os perfeccionistas podem se encontrar em diversas situações, exemplificadas a seguir:
Desvalorização do Próprio Desempenho: Mesmo ao alcançar seus objetivos, podem desvalorizar suas conquistas ("A prova estava muito fácil, outros alunos tiraram notas maiores que a minha"). Nesse cenário, a pessoa perde o prazer nas realizações, concentrando-se apenas nas áreas que poderiam ter sido aprimoradas, negligenciando o que foi alcançado.
Estabelecimento de Metas Inalcançáveis: Ao criar metas extremamente elevadas, que são impossíveis de serem atingidas, perfeccionistas podem se autocriticar intensamente por não conseguir alcançar tais objetivos.
Interpretação Draconiana de Falhas: Falhas ou fracassos são interpretados como grandes tragédias ou evidências de falta de valores e capacidades, em vez de eventos normais na vida. O medo de falhar pode levar a um esforço excessivo para evitar qualquer erro, gerando um estresse significativo.
Essas situações culminam em uma autocrítica intensa, levando à revisão dos próprios valores. Não é incomum que pessoas perfeccionistas evitem ou adiem tarefas, equivocadamente percebendo-as como provas de sua inadequação, resultando em níveis elevados de estresse e ansiedade.
Lidando com o Perfeccionismo
Refletir sobre o perfeccionismo é essencial para interromper o ciclo. Analise como você mantém esse padrão em sua vida, compreendendo os fatores por trás da autocrítica severa, as estratégias para compensar as elevadas metas e as conclusões sobre si mesmo quando os padrões não são atendidos.
Durante o tratamento psicoterápico, a Terapia Cognitivo-Comportamental oferece estratégias específicas:
Autoconhecimento e Psicoeducação: Explore os motivos do perfeccionismo e os fatores que o sustentam. Entender sua história e relação pessoal com o perfeccionismo é crucial para impulsionar a mudança.
Identificação e Questionamento de Pensamentos Distorcidos: Reconheça o papel crucial dos pensamentos em suas respostas emocionais e comportamentais. Ativamente identifique, questione e modifique pensamentos distorcidos para uma resposta mais adaptativa.
Experiências para Construção de Novos Comportamentos: Além de modificar pensamentos, vivencie gradualmente novas experiências. Avalie as consequências de agir de maneira diferente com base em pensamentos específicos e estabeleça estratégias para flexibilizar padrões, interrompendo o ciclo do perfeccionismo.
Aceitação e Autocompaixão: Enfrente a autocrítica severa cultivando uma postura autocompassiva. Seu terapeuta irá apoiá-lo no desenvolvimento de tolerância, não julgamento e aceitação diante de falhas, contribuindo para uma relação mais saudável consigo mesmo.
Superando o Perfeccionismo
A modificação de uma característica que acompanha uma pessoa por vários anos pode parecer desafiadora, mas é possível. O esforço contínuo para realizar tudo de forma perfeita pode levar à exaustão, enquanto o medo de falhar pode gerar ansiedade e paralisia. Profissionais especializados, como psicólogos, estão disponíveis para oferecer suporte na busca por soluções e novas formas de pensamento e comportamento.
A jornada rumo à mudança requer calma, paciência e dedicação. É crucial lembrar que a transformação do modo de pensar não ocorre da noite para o dia, e que falhas são partes inevitáveis da vida, presentes em todo novo desafio enfrentado. Muitas vezes, os maiores obstáculos são construídos pela própria pessoa, devido aos padrões elevados e expectativas grandiosas.
Se, até agora, você alcançou diversas metas apesar do sofrimento causado pelo perfeccionismo, imagine o quão satisfatório e gratificante será suas conquistas ao adotar padrões mais flexíveis. A jornada pode ser desafiadora, mas o potencial para uma vida mais equilibrada e gratificante está ao alcance.
Fonte:
MENDES, M. A.; TALASK, G. Perfeccionismo. In: Psicoeducação em Terapia Cognitivo-Comportamental, 1ª ed., 2019, p. 291-
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