Postado por Diego do Nascimento Souza em 29/04/2025 15:28
Vivemos em uma época que idolatra a autenticidade, mas teme a mudança. Escutamos frases como “seja você mesmo” como se elas fossem mantras de salvação emocional. E, de fato, há poder em ser quem se é. Mas o que acontece quando o nosso “eu de sempre” começa a nos machucar? Quando aquela versão de nós, tão fielmente defendida, já não cabe mais nos sonhos que temos hoje?
A ideia de “ser você” não deve ser confundida com “ficar parado no tempo”. Nossas experiências, dores, perdas e conquistas moldam partes de nós que antes sequer existiam. Crescer dói. Mudar assusta. Mas o maior perigo é insistir em ser o mesmo de ontem só para não decepcionar expectativas que nem são mais suas. A estagnação emocional pode parecer confortável, mas cobra um preço altíssimo: o de uma vida não vivida.
Ser sempre você significa respeitar sua essência, seus valores, sua integridade. Mas nunca ser o mesmo exige coragem para reconhecer que algo em você precisa — e merece — ser transformado. Talvez você ainda esteja tentando ser aceito por pessoas que nem fazem mais parte da sua vida. Talvez esteja preso a padrões que foram úteis em algum momento, mas hoje só servem para te impedir de crescer.
No consultório, vejo frequentemente pessoas que chegam exaustas de carregar uma versão de si que já não faz sentido. Sentem culpa por querer mudar. Medo de se perderem. Mas o curioso é que a mudança não é traição à identidade; é justamente o caminho para honrá-la. Somos feitos de camadas. Cada fase da vida pede um novo olhar sobre quem somos — e sobre quem podemos ser.
A mudança não acontece da noite para o dia. Ela começa em silêncio, quando algo dentro de nós sussurra: “Você pode mais do que isso.” Ignorar esse sussurro é ignorar o próprio chamado à vida. E viver pela metade, convenhamos, é um desperdício muito cruel. Você não veio ao mundo para se encaixar, mas para florescer — mesmo que isso exija abrir mão de folhas secas.
Muitas vezes, confundimos permanência com lealdade. Achamos que mudar de ideia, de estilo, de caminho é sinal de fraqueza. Não é. É sinal de lucidez. Há força na flexibilidade. Há coragem em se revisar. E há uma paz imensa em perceber que você não precisa mais ser aquela versão sua que só sabia sobreviver. Você pode, sim, aprender a viver.
Ser sempre você é continuar buscando sentido nas coisas. É ouvir sua intuição, é reconhecer seus limites, é honrar suas dores sem se aprisionar nelas. Mas nunca ser o mesmo é permitir que novas possibilidades se apresentem. Que novos sentimentos te visitem. Que novos hábitos te curem. Que novas verdades se revelem — mesmo que elas derrubem certezas antigas.
Você não está perdido porque mudou. Está evoluindo. E evolução, às vezes, parece caos antes de fazer sentido. A lagarta também acha que é o fim quando começa o casulo. Mas é justamente ali que nasce a possibilidade do voo. Por isso, seja sempre você. Com seus valores, com sua sensibilidade, com sua história. Mas nunca, jamais, se obrigue a ser o mesmo.
Se você sente que está num impasse interno — dividido entre permanecer e mudar — talvez seja hora de olhar com mais carinho para essa transição. Não como uma crise, mas como um convite. Permita-se sair do automático. Questione suas rotinas, suas escolhas, suas relações. O que ainda faz sentido? O que está pedindo silêncio? O que dentro de você está implorando por espaço?
Termino este texto com uma proposta prática: escolha hoje uma coisa em você que precisa ser atualizada. Pode ser um pensamento, um comportamento, um vínculo. Escreva sobre isso. Reflita. E, se quiser ir mais fundo, busque ajuda terapêutica. A psicoterapia não te transforma em outra pessoa. Ela apenas te ajuda a voltar para casa — para si mesmo — com novas janelas abertas. Afinal, ser você é um processo. Mas continuar o mesmo para sempre... isso sim é desistir de viver.