Postado por Carolina de Souza em 14/12/2025 23:49
Em meu artigo "Violência contra mulheres lésbicas/bissexuais e vulnerabilidade em saúde: revisão da literatura", publicado na revista Psicologia, Saúde & Doenças (2021, v. 22, n. 2), analiso de forma crítica o que a literatura científica tem produzido sobre a violência contra mulheres lésbicas e bissexuais e sua relação com a vulnerabilidade em saúde. A motivação para esse estudo nasce do reconhecimento de que, embora a violência contra as mulheres seja amplamente discutida como um grave problema de saúde pública, as experiências específicas de mulheres com orientações sexuais não heteronormativas ainda permanecem pouco visíveis, tanto na pesquisa quanto nas políticas públicas.
Para desenvolver essa análise, realizei uma revisão integrativa da literatura, reunindo estudos publicados entre 2006 e 2019 em bases de dados nacionais e internacionais da área da saúde e da psicologia. O objetivo foi mapear quais tipos de violência vêm sendo investigados, quais populações têm sido incluídas nas pesquisas e quais são os principais impactos dessas experiências na saúde física e mental das mulheres lésbicas e bissexuais. Ao todo, foram analisados 11 estudos, majoritariamente quantitativos, produzidos sobretudo em países da América do Norte e da Europa, o que já aponta para uma lacuna importante de pesquisas no contexto brasileiro.
Os resultados mostram que mulheres lésbicas e bissexuais estão expostas, de forma recorrente, a diferentes formas de violência ao longo da vida, incluindo violência sexual, física e psicológica. Muitas dessas experiências têm início ainda na infância ou adolescência e podem se prolongar ou se repetir na vida adulta, configurando um ciclo de vitimização. Um dado relevante é que essas violências não se explicam apenas pela condição de gênero, mas também pela discriminação associada à orientação sexual, o que coloca essas mulheres em uma posição de dupla vulnerabilidade.
Outro aspecto que se destaca nos estudos analisados é o impacto dessas vivências na saúde. A exposição à violência está associada a maiores níveis de sofrimento psicológico, sintomas depressivos, uso problemático de álcool e outras substâncias, além de riscos acrescidos para infecções sexualmente transmissíveis. Ainda assim, muitas mulheres relatam dificuldades em buscar ajuda, seja pelo medo de sofrer discriminação nos serviços de saúde, seja pelo receio de reforçar estigmas negativos sobre relacionamentos entre mulheres.
Ao longo do artigo, discuto também como a invisibilidade da violência contra lésbicas e bissexuais contribui para a subnotificação dos casos e para a ausência de respostas institucionais mais eficazes. As políticas públicas de enfrentamento à violência de gênero, em geral, não consideram as especificidades relacionadas à orientação sexual, o que limita o alcance das ações de prevenção, acolhimento e cuidado. Além disso, os serviços de saúde nem sempre estão preparados para reconhecer essas demandas e oferecer um atendimento sensível às diferenças.
Este estudo reforça a importância de ampliar a produção científica sobre o tema, incorporando abordagens qualitativas, recortes interseccionais e pesquisas realizadas em diferentes contextos socioculturais. Também aponta para a necessidade de formação de profissionais e de fortalecimento de políticas públicas que reconheçam as experiências de mulheres lésbicas e bissexuais como parte central do debate sobre violência e saúde.
Este texto apresenta apenas uma síntese do trabalho. Para conhecer de forma mais aprofundada o percurso metodológico, os resultados detalhados e as reflexões desenvolvidas, convido você a acessar o artigo completo, disponível na íntegra no periódico científico em que foi publicado.
Leia o artigo na íntegra: https://scielo.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-00862021000200437