Postado por Maria Cecilia Ramalho de Camargo em 25/09/2025 16:36
A flexibilidade psicológica é considerada o centro da Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), abordagem de terceira onda das terapias comportamentais contextuais, desenvolvida por Steven C. Hayes e colaboradores nos anos 1980. Diferente de uma compreensão simplificada que associa flexibilidade apenas a “se adaptar às situações”, na ACT o termo refere-se à capacidade de estar em contato com o momento presente, abrir-se às experiências internas – mesmo quando dolorosas – e agir em consonância com os próprios valores (Hayes, Strosahl & Wilson, 1999/2012).
Hayes et al. (2006) definem flexibilidade psicológica como:
“a capacidade de entrar em contato com o momento presente plenamente, como um ser humano consciente, e mudar ou persistir em comportamentos em função do que a situação permite e do que está de acordo com valores pessoais escolhidos.”
Esse conceito contrapõe-se à inflexibilidade psicológica, caracterizada pela evitação experiencial, fusão cognitiva e rigidez comportamental. Nessas condições, a pessoa passa a agir dominada por pensamentos ou pela tentativa constante de evitar sofrimento, o que frequentemente leva a afastamento de uma vida significativa.
A ACT propõe seis processos interdependentes que, juntos, constroem flexibilidade psicológica:
Aceitação – disposição para vivenciar emoções, pensamentos e sensações sem evitá-los.
Defusão cognitiva – observar pensamentos como eventos mentais, e não como verdades absolutas.
Contato com o momento presente – atenção plena à experiência atual, favorecendo clareza e engajamento.
Eu como contexto – percepção de si como espaço de consciência, e não como conteúdo ou rótulo fixo.
Valores – clarificação daquilo que confere direção e sentido à vida.
Ação com compromisso – escolha de comportamentos alinhados aos valores, mesmo diante de desconforto.
Esses processos não significam eliminar sofrimento, mas aprender a viver com mais abertura e flexibilidade, criando espaço para uma vida orientada pelo que importa.
Na prática, ser flexível não é “ceder sempre” ou “abrir mão de si”. Pelo contrário: é agir de forma intencional e consciente. Por exemplo:
Um profissional ansioso diante de uma apresentação pode escolher falar em público, mesmo com a presença da ansiedade, porque valoriza o crescimento profissional.
Uma pessoa em um relacionamento pode abrir espaço para a insegurança e, ao mesmo tempo, escolher comportamentos que sustentem a intimidade e a conexão, em vez de evitar conversas importantes.
Ser flexível, na perspectiva da ACT, é aprender a conviver com a inevitabilidade do sofrimento humano sem que isso paralise a ação em direção a uma vida significativa. Trata-se de cultivar uma postura aberta, consciente e comprometida com valores, em vez de ficar preso a tentativas infrutíferas de controle de pensamentos e emoções.
Assim, a flexibilidade não é apenas uma habilidade desejável: é uma competência essencial para uma vida plena e valorosa.
Hayes, S. C., Strosahl, K. D., & Wilson, K. G. (2012). Terapia de Aceitação e Compromisso: o processo e a prática da mudança consciente (2ª ed.). Porto Alegre: Artmed.
Hayes, S. C., Luoma, J. B., Bond, F. W., Masuda, A., & Lillis, J. (2006). Acceptance and Commitment Therapy: Model, processes and outcomes. Behaviour Research and Therapy, 44(1), 1–25.
Wilson, K. G., & Luciano, C. (2002). Terapia de Aceptación y Compromiso: un tratamiento conductual orientado a los valores. Madrid: Pirámide.